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A Tacacazeira no Círio.

Desde a primeira vez que eu vi essa foto, fiquei encantada com ela. Hoje no domingo do Círio eu queria compartilhar sobre ela com todos vocês. O meu encantamento ocorre porque ela simboliza muito o Círio de Nazaré. É uma barraquinha de uma vendedora de tacacá,  no arraial de Nazaré, no ano de 1936. Na inscrição da imagem encontra-se assim: "As barraquinhas modestas mas frequentadas onde se acham as iguarias regionais" (1) Espalhadas pelo arraial de Nazaré, muitas barraquinhas como está eram  possíveis de se encontrar com venda de comidas regionais e também bebidas. Notem que a barraquinha está com muitos fregueses, uma das mulheres no canto direito prepara uma cuia de tacacá, muito concentrada no seu ofício. É possível também que se vendesse outros tipo de comida, uma maniçoba? Um vatapá? Um caruru? Isso é possível de se pensar já que a mulher do centro também vendedora segura um prato, o que nos leva a crer que seja outro tipo de comida, já que tacacá, se toma apenas na cuia. Essa realidade era comum na época e presente até os dias de hoje, já que as barraquinhas de comida regional muitas vezes ofereciam vários tipos de comida. Notem que as duas vendedoras estão vestindo branco e usam as toucas também brancas que caracterizam seu oficio, como nos aponta Írio Barbosa da Costa: "Diàriamente, nas pracinhas e esquinas de determinadas ruas, encontra-se avendedora de tacacá, com trajes geralmente brancos, impecàvelmente engomados, sentadas no seu banco, tendo à frente o tabuleiro forrado com toalha branca, onde se encontra a panela cheia de goma cozida e várias cuias com inscrições e decorações(...)".(2) Observem também os pés descalços? Provavelmente eram pagadores de promessas e romeiros que faziam o trajeto descalços? O Círio é também uma festa dos pés nus, da corda e dos votos que feitos secretamente entre o devoto e a santinha, são publicizados no domingo da romaria, em forma de vela e ou objetos de miriti que simbolizam suas promessas: a cura de uma doença, a compra da casa e a saúde de um filho, que muitas vezes acompanhavam/acompanham [Prática comum até hoje] o Círio vestidos de anjinhos ou como o menino no canto a esquerda vestido de marinheiro. Mas, apesar dos pés nus notem que as roupas são pensadas especialmente para esse dia. Aliás, paraense compra a roupa do Círio,  [lembro quando éramos crianças e mamãe mandava fazer a roupa do Círio minha e de meus irmãos]. O tabuleiro, este tinha tudo que era necessário para a sua venda. Segundo Írio Barbosa, geralmente: "Existe, ainda, neste tabuleiro, uma tigela grande com môlho de pimenta de cheiro, malagueta ou murupi, coberta por um pires de sal, quando descoberto exala um cheiro agradável e convidativo. Num fogareiro de carvão, constantemente aceso, está a panela de tucupi com jambu e camarão, que aí é colocado em pequena quantidade, principalmente as cabeças, para acentuar o gôsto, pois o preço exorbitante do camarão sêco faz com que elas o dividam em 2 ou 3 pedaços, conforme o seu tamanho". (3) A fotografia faz parte do Álbum do Círio, do acervo do Museu do Círio, desde 1986. O álbum que tem 23 folhas com 49 fotos foi recentemente digitalizado pelo Arquivo Público do Estado e está em exposição durante o Preamar do Círio. Então, o Álbum do Círio agora faz parte do acervo documental tanto do Arquivo Público do Estado quanto do Museu do Círio. (4)Eu poderia ficar horas e mais horas contemplando a foto, as pessoas, a cena em si. Ela é de um simbolismo e realidade única. Deixo que vocês contemplem também.
Feliz Círio, para todos àqueles que são desta fé e um domingo de muita luz para todos nós!
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📚✍️🏽 Referências.
📸 (1)(4)Albúm do Círio. Museu do Círio. Belém,  1936.
Deixo registrado meu agradecimento ao (4) Anselmo Paes pela generosidade de sempre.
(2)(3) Írio Barbosa da Costa. A Vendedora de Tacacá. Tipos e Aspectos do Brasil. Fundação IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia). Excertos da REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA. Ilustrações: Percy Lau Barboza Leite 9.• Edição, Aumentada. Departamento de Documentação e Divulgação Geográfica e Cartográfica. Rio de Janeiro, 1970, p, 8. 

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