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Raspa-raspa, granizado? o raspa-raspa em Belém.

Você conhece o Granizado? Ou o raspa-raspa? Não!? Tenho certeza de quem mora em Belém conhece o raspa-raspa? Pois bem, o Granizado e o raspa-raspa são nomes diferentes de um produto semelhante. Você sabe a origem do raspa-raspa? Você sabia que uma provável origem da versão que conhecemos em Belém, seja em Baltimore, nos Estados Unidos? E que provavelmente tenha chegado em Belém devido às relações econômicas com os americanos e a produção de gelo? Então, vem comigo conhecer um pouquinho mais dessa História. Segundo Michelle Gienow, em “Cold Comfort: On the Cultural Significance of the Snowball in Baltimore”, o Granizado teria origem na década de 50, do século XIX,  quando desenvolveu-se uma indústria americana do gelo. O comércio das casas de gelo entre Nova York e a Flórida era constante e muito intensa. Para que esse gelo chegasse na Flórida era preciso transportá-lo em grandes blocos de trem. O trajeto passava por Baltimore, e lá as crianças desenvolveram uma prática de pedir pedaços de raspagem do gelo. Com o tempo as mães pensaram em acrescentar algo que desse sabor ao gelo. A autora nos informa ainda que, um dos primeiros sabores era um "creme" elaborado com ovos, baunilha e açúcar. (1) Em Belém,  o raspa-raspa também desenvolveu-se a partir de uma indústria do gelo. Segundo Marc W. Herold, "A indústria de gelo (...) no Brasil na virada do século XX foi mais desenvolvida no Pará ou Belém, situada na foz do rio Amazonas (...) O pioneiro da indústria de gelo no Pará foi um engenheiro italiano, Francisco Bolonha (1872-1938) (...) Junto a um número de sócios locais, Bolonha estabeleceu com sucesso três fábricas de gelo durante 1896-99." Assim,  "Um relatório consular dos EUA de 1894 de Pará, se referiu a uma pequena fábrica de gelo que operava no Pará, com uma capacidade de 2 toneladas por dia e o gelo sendo vendido a 3 ½ centavos por libra (...) Bolonha e seus parceiros na sociedade, Bolonha, Paiva, & Cia operavam a Fábrica de Gelo Paraense, a Fábrica de Gelo Crystal, e a Fábrica de Gelo Reducto. Bolonha tinha visitado os Estados Unidos para comprar equipamento para fabricar gelo de uma empresa em Delaware, Remington Machine Co". As fábricas de gelo no Pará enviavam gelo a vários portos do Brasil".(2) Provavelmente,  o raspa-raspa em Belém, desenvolveu-se a partir da presença das fábricas de gelo no Pará e suas relações com os Estados Unidos.
Em Belém, ainda hoje é possível de se ver os carrinhos de raspa-raspa. E muitos moradores devem se lembrar dos carrinhos de raspa-raspa como o da fotografia. Na belíssima fotografia, de Robert Larimore Pendleton, datada de 1949, tirada em frente a Igreja de Santo Alexandre, no bairro da Cidade Velha, nos permite observar uma realidade muito comum da venda de raspa-raspa. O carrinho geralmente conduzido por um vendedor, levava um grande pedaço de gelo, as garrafas de vidro com os sucos/xaropes de diversos sabores. Geralmente, os carrinhos eram em formato de barco, uma referência à região da Amazônia e seus rios. O da fotografia tem o nome de "Graça Divina". Os sabores variavam entre coco, maracujá, groselha, abacaxi, uva, morango, cupuaçu, bacuri e tantos outros. No meio do carrinho sob um pano ficava o gelo que era raspado, com um "raspador" de alumínio próprio para esse ofício. Naquela época não havia uso comum do copo descartável, então, o raspa-raspa era servido naqueles copos americanos de vidro, que ainda hoje encontramos nas tabernas e mercearias. O vendedor raspava o gelo, colocava no copo e derramava por cima o suco/xarope escolhido pelo freguês. Detalhe, essa também era uma realidade de muitos interiores do Pará: os carrinhos em formato de barco que vendiam o raspa-raspa. Minha mãe, lembra que em Abaetetuba, o raspa-raspa era um opção muito procurada, especialmente pela criançada nas festividades do arraial, ela diz que seu "sabor preferido era o de maracujá" e que havia um senhor que vendia na praça da Conceição,  ele servia nos copos americanos com uma colherzinha em cima. Numa região de clima quente, não poderia ser diferente...o raspa-raspa era sucesso absoluto. 
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💬 E na sua cidade existiu o raspa-raspa? Como eram chamados? Qual teu sabor preferido? Me conta.
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Referências. 
📸  Robert Larimore Pendleton. Belém, o berço da Amazônia Brasileira. Ano de 1949. 🔖 Qualquer óbice em relação a imagem por favor nos avisar. (1) Gienow, Michelle. “Cold Comfort: On the Cultural Significance of the Snowball in Baltimore” City Paper. September 18, 1996. Retrieved January 20, 2011. (2) Gelo nos Trópicos: a exportação de “Blocos de cristais da frieza 
ianque” para Índia e Brasil 
Marc W. Herold. Tradução: Mario E. González. Revista Espaço Acadêmico. N°126, nov, 2011. p. 156/157. 

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